"Quem já descobriu a Cristo deve levar Ele aos outros. Esta alegria não se pode conter em si mesmo. Deve ser compartilhada." (Papa Bento XVI)

segunda-feira, 27 de abril de 2009

Ressurreição, tempo de misericórdia


O tempo é de ressurreição. Já não podemos mais ouvir os gritos do calvário, o movimento curioso de quem desejava a tragédia , a morte pública e cruel. O que temos é o jardim vistoso sugerindo primaveras. A vida revestida de cores mansas como se uma chuva miúda devolvesse aos poucos o frescor que combina com as manhãs.

O que me instiga em tudo isso é a falta de provas para o fato. O sepulcro estava aberto, vazio. Mas isso não era o suficiente para que a ressurreição fosse proclamada. Alguém poderia ter roubado o corpo. Não faltariam incrédulos para essa suspeita.

A certeza da ressurreição não consiste em provas materiais para o fato. A imposição dessa verdade não passa pela materialidade do mundo, nem tampouco pode ser explicada através das claras regras que foram postuladas por nossa razão cartesiana.

Estamos falando de algo maior, superior. O que despertou o grito da ressureição foi o encontro dos olhares de quem havia estado com Ele. Foi o momento em que João reconheceu em Pedro a presença do Mestre. Resquícios esquecidos na alma, doação existencial que o configurava de forma renovada, como se tivesse nascido de novo.

"Ele está no meio de nós!" - A voz proclama. Gita o que ainda não compreende. Grita o que intui em mistério, o que descobre aos poucos. A alma reconhece na carne o milagre da continuidade. Os desdobramentos da Eucaristia celebrada dias antes tornam-se evidentes. João vê na carne de Pedro a carne de Jesus. É o mesmo sangue, é a comunhão estabelecida. O sangue jorrado na cruz encontrou novas veias e por elas corre.

É o olhar epifânico ardendo como a sarça ardeu diante dos olhos de Moisés. Sarça humana, pupilas dilatas de alegria, incapacitadas de esconderem os olhos que estavam por trás dos olhos de Pedro. Olhos que deixaram de brilhar no calvário, mas que agora são reacendidos nos olhos do amigo que ficou. O apóstolo é a continuidade do Mestre. Simbiose que faz o agir ser o mesmo, como se uma costura atasse a vida de Pedro à vida de Cristo.

É o ser emprestado em sacramento, força que o altar atualiza e que a alma recebe prostrada, generosa. A sobrevivência do Cristo passa pela alma que o aceita. É preciso acolher o dom de ser ressurreto. Passa pela nossa carne esta mística que nunca terá fim. Não aceitá-la é o mesmo que viver a privação da felicidade. Não é possível ser feliz fora desta dinâmica. As religiões nos ensinam. É preciso aprender. O altar estendido é o banquete do encontro. O Cristo sentado à mesa nos ensina de forma simples e duradoura que é preciso crescer na ressurreição. Ele nos dá de comer. "Isto é o meu corpo". Ele nos dá de beber. "Isto é o meu sangue".

É Nele que nos transformamos. Quando por Ele nos decidimos,, Dele nos tornamos continuidade. Cada um ao seu modo vive o seu processo. É estrada humana também. Jesus nos ensinou a humanidade antes de nos propor o céu. Por isso o aperfeiçoamento de tudo o que é humano é exercício de santidade. O pecado nos mata, mas a ressurreição nos socorre.

Viver e morrer são dinâmicas inevitáveis. Cada um sabe o tanto que morre. Cada um sabe o tanto que vive. As escolhas estão por toda parte.

Mas o Cristo está diante de nós. Em suas mãos não há outra coisa senão a sua Misericórdia. O motivo de sua morte é o motivo de nossa vida. Ele morreu porque quis nos ensinar que a justiça divina compreende também a sua capacidade de amar. Ele nos deu o direito de sermos íntimos do Pai. Ensinou caminhos simples, diretos, sem rodeios.

Ensinou que podemos ser santos, mesmo sendo proprietários de tantos defeitos. Ensinou que há sempre uma esperança escondida dentro de nós, e que procurar por ela é um jeito bonito que temos de colocar os nossos passos nas marcas de seus pés.

Neste tempo de Ressurreição queiramos a sua misericórdia.

Eu quero. Queira também. Eternamente.

Pe. Fábio de Melo

Publicado no Blog do Pe. Fábio de Melo

quarta-feira, 15 de abril de 2009

O segredo é perdoar


Devemos sempre nos lembrar de como Deus nos perdoou em Cristo
Para que uma mágoa, ou qualquer outro problema, se transforme em ressentimento dentro de nosso coração, precisamos alimentá-la com o murmúrio. Todos nós nos decepcionamos quando algo inesperado nos acontece. Isso é normal. O problema é que depois ficamos revivendo o fato e remoendo-o dentro do coração. O primeiro grande segredo para a cura de nossos ressentimentos é treinar o coração para perdoar sempre. Não importa se a pessoa nos ofendeu porque quis ou por descuido. Não importa se a pessoa nos machucou consciente ou inconscientemente. Não importa nem mesmo se ela é amiga ou inimiga; o segredo é perdoar. Perdoar sempre! Perdoar tudo o que nos fizeram! E para perdoar é totalmente fundamental declarar o perdão, manifestá-lo explicitamente.

“Antes, sede uns como os outros bondosos e compassivos. Perdoai-vos uns aos outros, como também Deus vos perdoou, em Cristo” (Ef 4,32).

“Suportai-vos uns aos outros e perdoai-vos mutuamente, toda vez que tiverdes queixa contra outrem. Como o Senhor vos perdoou, assim perdoai também vós. Mas, acima de tudo, revesti-vos da caridade, que é vínculo da perfeição” (Cl 3,13-14).

Para perdoar os outros devemos sempre nos lembrar de como Deus nos perdoou em Cristo. Devo perdoar quem me ofendeu, não porque eu seja bom ou a pessoa é boa. Devo perdoar não porque a pessoa mereça ser perdoada. Afinal de contas, se fomos tentar saber se a pessoa tem ou não tem culpa, se fez aquilo consciente ou inconscientemente, acabaremos por cair no murmúrio, até porque naquele momento nosso coração está ferido e machucado, e numa situação assim, ninguém consegue pensar corretamente. Logo, para evitar qualquer possibilidade de alimentar a mágoa, o segredo é perdoar imediatamente. E perdoar como o Senhor nos perdoa. Para isso é preciso revestir-se da caridade.

Caridade não é dar alguma coisa a alguém. Isso é filantropia. Caridade é dar-se inteiro a alguém que não merece! Foi isso que Jesus fez por mim e por você. Foi isso que o Senhor fez pela humanidade inteira. Ele se ofertou, inteiramente, a todos, inclusive àqueles que estavam sendo usados para crucificá-Lo: “Pai, perdoa-lhes; porque não sabem o que fazem” (Lc 23,34).

Somente pelo perdão vivido explicitamente é que nos tornamos, de fato, filhos e filhas de Deus. Enquanto não perdoamos, estamos vivendo como se fôssemos adotados pelo "encardido" [maligno]. Aliás, muitas vezes, nos comportamos assim.

É preciso perdoar sempre e perdoar escpecialmente os que não merecem nosso perdão. Esse é o segredo que nos faz agir como filhos e filhas de Deus.

Do livro 'A cura do ressentimento'
Pe. Leo

Publicado no Portal da Comunidade Canção Nova